O prejuízo operacional das operadoras de planos de saúde (sem incluir odonto e administradoras de benefícios) acumulado em 2022 foi o maior desde 2001, quando a ANS começou esse tipo de análise.
O resultado ficou negativo em R$ 11,5 bilhões, de acordo com a atualização do Painel Contábil da Saúde Suplementar com dados econômico-financeiros relativos ao 4º trimestre de 2022.
O tombo é significativo porque as operadoras vêm de um ano de lucro operacional forte de R$ 18,7 bilhões em 2020 (devido à redução de procedimentos durante a pandemia) e R$ 900 milhões negativos em 2021. Ou seja: a conta, finalmente, chegou. Ou, melhor dizendo, agora pode ser conhecida.
Não é novidade
A verdade é que, independente do modo de apresentação dos dados pela ANS para a composição do resultado operacional, se simplesmente retirarmos a receita do resultado de aplicações financeiras, em muitos outros anos o resultado líquido também seria negativo.
Na divulgação dos dados, a ANS classificou os resultados como um “zero a zero”. Já que, apesar do prejuízo operacional, as operadoras fecharam o ano com lucro líquido de R$ 2,5 milhões (apenas 0,001% das receitas de operações de saúde do setor no ano passado, de R$ 237,6 bilhões).
Vale observar que, olhando estritamente para operadoras de plano de saúde sem odonto ou administradoras de benefícios, não é sequer “zero a zero”, e sim um prejuízo de R$ 505,7 milhões.
O índice apurado em 2022 com margens praticamente zeradas ou negativas ainda poderia ter sido pior se nesse ano não houvesse um maior resultado financeiro obtido pelas operadoras com o aumento das taxas de juros que remuneram os ativos garantidores e aplicações financeiras. O resultado financeiro ficou em R$ 9,4 bilhões.
Segundo a ANS, 43% das operadoras fecharam o ano no vermelho em 2022, o que também representa a maior proporção da série histórica iniciada em 2002. Um sinal bastante claro de que algo não vai bem.
Análise fria
Segundo a ANS, os resultados podem ser explicados pelo aumento dos custos de procedimentos médicos, mas, embora menos frequente, também podem ser gerados pela queda ou estagnação das receitas.
No caso concreto do mercado de saúde suplementar, em uma avaliação preliminar, as despesas assistenciais não apresentaram crescimento que possa justificar o aumento da sinistralidade. No entanto, as receitas advindas das mensalidades parecem estar estagnadas.
Essa análise é compatível inclusive com nosso recente diagnóstico de downgrade do mercado. Isso considerando que nem mesmo o custo assistencial variou de forma tão expressiva como aconteceu, por exemplo, em 2021.
Os dados atualizados de dezembro também confirmam o constante aumento da base de beneficiários dos planos desde o início da pandemia, de 47 milhões em dezembro de 2019 para 50,4 milhões em dezembro de 2022. Então, por que os resultados são tão ruins?
Downgrade de planos
Como já antecipamos, um movimento que explica a situação atual é o downgrade dos planos de saúde. Quer dizer: a base cresceu, mas o valor médio dos planos caiu. Para não deixar o benefício, famílias e empresas trocaram seus contratos por outros mais baratos.
Há ainda a possibilidade de que a precificação por parte das operadoras, na intenção de aumentar sua base de clientes, não tenha sido suficiente. Isso mesmo levando em conta a atual etapa de crescimento dos beneficiários e a existência de um número importante de empresas com menos de 30 vidas. Muitos beneficiários dessas empresas, inclusive, estão em carência.
As operadoras alegam, ainda, que não foi possível repassar os aumentos de custos para as empresas contratantes de planos de saúde – que são a grande maioria de seus clientes -, mas isso nunca foi viável. Não apenas agora. Não fosse assim, a sinistralidade seria muito mais baixa e não ficaria orbitando há tantos anos num patamar entre 82% e 85%.
Sinistralidade aumenta 2,1 pontos
Os dados da ANS mostram ainda que a sinistralidade aumentou 2,1 pontos percentuais de 2021 para 2022 e chegou a 89,21%. Isso ainda está em parte relacionado ao represamento ocorrido durante a pandemia e ao aumento da demanda após 2020, que até pode configurar uma mudança no comportamento de consumo de planos de saúde. Mas é claro que se a receita per capita está diminuindo, a sinistralidade cresce.
Há também que se considerar a liberação de terapias sem limites e a incorporação de novos procedimentos e medicamentos para tratamento de algumas doenças, que espremeram a margem das operadoras.
No entanto, ainda não estamos medindo totalmente esse impacto. Isso teria afetado parcialmente 2022, e não temos os dados atualizados disponíveis do mapa assistencial da ANS.
Uma certeza e algumas dúvidas
O fechamento dos dados de 2022 forma a convicção para o que até então era apenas uma quase certeza: 2023 será um ano em que as operadoras tentarão repor perdas. Isso significa índices de reajuste elevados, principalmente para planos coletivos, em que a negociação é livre.
E restam algumas dúvidas. É saudável que empresas que operam um mercado de alto risco, como o da saúde suplementar, tenham lucro por meio de aplicações financeiras? O que representa o fato de 40% dos beneficiários estarem em operadoras que registraram prejuízo operacional?
O que pensamos
Para nós, da Arquitetos da Saúde, é mais uma oportunidade de refletir sobre a necessidade de aumentar a eficiência dos planos de saúde e de cobrar mais transparência de toda a cadeia para a formação de indicadores mais claros na formulação de contratos e reajustes.
Deveríamos ter, de um lado, empresas que não penalizam o consumidor por suas perdas. E, do outro lado, contratantes mais empoderados justamente para não reforçarem essa engrenagem que sempre se volta contra eles mesmos.
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A Arquitetos da Saúde é uma empresa que trabalha com consultoria para a gestão de planos empresariais, além de uma ferramenta de BI (Business Intelligence) voltada para o mercado de saúde suplementar.
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