Paulo Bastian, um construtor de pontes na saúde suplementar | Arquitetos da Saúde
Reflexões para Ontem

Paulo Bastian, um construtor de pontes na saúde suplementar

Assim como aconteceu com seu antecessor em 2014, o saudoso e também gaúcho de descendência alemã, José Henrique do Prado Fay, é chegado o momento de Paulo Vasconcellos Bastian deixar o comando do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (HAOC). Assim como Fay, Bastian completa 65 anos, a idade máxima permitida para um executivo da instituição. A partir de agora passará a assessorar o Conselho de Administração.

Bastian parte, mas fica na medida em que deixa um belíssimo legado que transcende o seu tempo e a fronteira da instituição que liderou como CEO nos últimos anos. A sua história na saúde vem de mais de duas décadas quando passou a ocupar a Superintendência Operacional da renomada instituição gaúcha Hospital Moinhos de Ventos, de 2000 a 2005. Desde então, transferiu-se com a família para a cidade de São Paulo, onde passou a ocupar esta mesma função na instituição da qual se despede agora.

Dos 15 anos dedicados com afinco ao HAOC, passou os últimos sete anos como CEO, contribuindo de forma harmônica para a continuidade do posicionamento estratégico da época em que Fay liderava a organização.  Sob sua gestão, inúmeras foram as realizações estratégicas, algumas das quais iniciadas e/ou semeadas por Fay. Naturalmente que não irei aqui esgotar o rol de realizações na gestão do Bastian, mas apenas destacar algumas que pude vivenciar relativamente de perto e que, por si só, exemplificam a amplitude das suas contribuições.

À frente da consultoria de benefícios nomeada pela instituição à época, recordo-me, com admiração, das iniciativas absolutamente inovadoras em termos de gestão de saúde corporativa implementadas pela instituição há mais de uma década. Infelizmente, até os dias de hoje, elas se configuram como raro exemplo de um contratante de planos de saúde que entende que seu papel ultrapassa a cômoda postura de simplesmente pagar o boleto do plano de saúde de seus colaboradores e dependentes.

Já àquela altura, o compromisso com a saúde dos colaboradores era um valor praticado e não discursado no HAOC. Este legado sustentável, iniciado por Fay e continuado por Bastian, foi aos poucos sendo implementado de forma pioneira. Frutos foram gerados como a parceria nesta área com a renomada Stanford University, contribuindo para a estruturação do Centro de Atendimento à Saúde do Colaborador (CASC), que ocupava uma importante área do hospital.  Pelo seu ineditismo e resultados, recebia uma peregrinação de visitantes interessados em conhecer e replicar o exitoso modelo. Sim, a generosidade de compartilhar as boas experiências era mais uma demonstração de um olhar “bastiano” sobre o sistema e não apenas sobre os interesses da instituição.

Ali presenciei os resultados desta iniciativa e seus desdobramentos em termos de saúde e, consequentemente, custos. Sim, ali havia a compreensão de que a redução de custos de forma sustentável só seria alcançada a partir de uma nova lógica de cuidado com a saúde de colaboradores e dependentes.

Ser pioneiro tem seu preço também e neste contexto vivi algo de inusitado quando negociávamos com a Sul América na época: a isenção de reajuste do plano de saúde dos colaboradores e dependentes, que caminhava para o terceiro ano consecutivo. Por orientação da área técnica da operadora que pleiteava ajustes de prêmios, uma vez que entendia que o mesmo estava defasado há tempos, tive uma ideia. Foi quando Rodrigo Demarch (à época gestor da área no HAOC) e eu convidamos os respectivos representantes da operadora para conhecer em detalhes o trabalho desenvolvido pela instituição, de forma a se convencer que não fazia sentido reajustar prêmios na medida em que o sinistro simplesmente não se alterava como consequência do trabalho estruturado, maduro e resolutivo. Ou seja, não fazia sentido usar a lógica (compreensível, que se diga) aplicada ao mercado na medida em que a realidade da instituição era absolutamente distinta. E assim foi feito.

Ato contínuo, o HAOC, já sob a gestão do Bastian foi o primeiro de cinco hospitais de referência na cidade de São Paulo a entender que era chegado o momento de alterar seu modelo de risco, algo que vínhamos provocando nos mesmos fazia algum tempo. O histórico acima descrito, bem como o conhecimento amplo da saúde dos colaboradores, se apresentavam como ingredientes necessários para esta mudança de modelo. Foi quando, de forma exitosa até os dias de hoje, alterou-se em outubro de 2015 o modelo de contratação do plano de saúde para pós-pagamento.

E Bastian foi além. Sempre pensando à frente e fora da caixa, entendeu a importância da corresponsabilidade do colaborador com sua própria saúde. Entendia que este compromisso não seria exitoso se ficasse limitado às políticas da empresa e à estruturação de uma área específica de gestão e assistência para este fim. Confirmando a saúde como um valor institucional, passou a incluir como parte dos indicadores de participação nos resultados dos colaboradores, quesitos inerentes à saúde dos próprios. Ou seja, preparou o terreno, estruturou a área de saúde corporativa, alterou o modelo de risco no momento correto, passou a medir resultados e comprometeu os colaboradores de forma pedagógica no compromisso de cuidar da sua própria saúde.

Infelizmente, este fantástico trabalho coordenado, multiprofissional, alinhado e estratégico, ainda se apresenta como uma exceção no contexto em que contratantes de planos de saúde parecem ainda não entender o papel de protagonismo que deveriam ter em relação à eficiência no cuidado e na gestão de custos da saúde dos colaboradores e dependentes. A vencedora iniciativa foi fruto de inúmeros reconhecimentos, entre os quais a premiação como vencedora do Global Healthy Workplace Awards, o mais importante prêmio em saúde e bem-estar populacional.

E Bastian, inquieto, silencioso e visionário, não parou por aí. Entre tantas outras disrupções no contexto de uma instituição altamente tradicional, ele entendeu a importância de, mais uma vez, praticar o discurso das tão necessárias e alardeadas mudanças no setor. Se de um lado inovara na gestão de saúde corporativa, de outro seguia o mesmo caminho enquanto prestador de serviços médico-hospitalares de referência nacional.  Foi quando inaugurou em 2018 a unidade Vergueiro do HAOC totalmente estruturado do ponto de vista de um modelo inovador de remuneração, pautado por previsibilidade de custos com compartilhamento de riscos. Repito, esta unidade já nasceu neste conceito, tão divulgado, mas muito pouco praticado até os dias de hoje. Bastian acertou ao não ficar refém de um modelo de negócios onde o prestador de serviços não participa do risco.

Fica fácil entender porque a minha profunda admiração por Bastian foi se transformando em amizade nutrida por profunda admiração. Com o tempo passei a falar bem pelas suas costas, compartilhando em conversas e textos algumas das pioneiras e exitosas realizações sob sua gestão. Pensando bem, Bastian nunca me pareceu muito afeito a isto. E faz ele muito bem. Aprendi com meu pai que não se fala mal dos outros e bem de si. Bastian é exemplo neste sentido. Mais do que um excepcional profissional, se apresenta como um ser humano ímpar. No contexto de um setor extremamente desconfiado, ele sempre lançava mão da construção de relações de confiança para derrubar muros e construir pontes.

Estaria a origem do seu comportamento embutida no significado do seu sobrenome? Alguns talvez considerem isto um possível devaneio de minha parte, mas não custa registrar que o nome Bastian se traduz na forma alemã e inglesa de Bastião, que é brasileiro, forma reduzida de Sebastião que, por sua vez, vem do grego e significa sagrado, referenciado. Ainda mergulhando em significados, complemento dizendo que Bastião é uma obra avançada de uma fortificação, lugar completamente seguro. Bastião, portanto, é claramente Bastian!

Despeço-me aqui com um muito obrigado ao amigo Bastian! Seu legado é admirável. Agradeço ao Bastian em nome de todos aqueles que têm o verdadeiro compromisso de tornar a saúde suplementar mais eficiente.

Por fim, peço licença para fazer um especial agradecimento à sua família. Afinal, além de contribuírem para a obra, gentilmente nos cederam parte expressiva do seu valioso tempo, talvez por vezes de forma demasiada, como é comum a executivos que ocupam a mesma cadeira. Saibam que não foi em vão. Os meus sinceros agradecimentos à sua esposa Vera Lucia, e aos seus filhos Francisco, Guilherme e Victoria! Por favor, Bastian, fique por perto. A saúde suplementar precisa de você!

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