Assisti durante o Health Summit da ANAHP, na Feira Hospitalar de 2018, debate a respeito de Desfechos Clínicos. A meu ver, esta importante quebra de paradigma para o setor hospitalar se traduz no maior desafio das instituições de saúde rumo à mensuração de valor da assistência que oferecem.
Segundo Peter Drucker, o hospital é a empresa mais complexa que se conhece, é um monstro de duas cabeças, administração e assistência. Do ponto de vista da administração, uma parcela importante das instituições de saúde evoluiu de forma expressiva desde o início da regulamentação da saúde suplementar. Entre as inúmeras frentes adotadas citamos a acreditação hospitalar, compliance e eficiência operacional. Estas iniciativas contribuíram para a melhoria de processos, medição de determinados indicadores, transparência na gestão e melhoria de resultados.
Se do lado da gestão da administração muito se evoluiu, do ponto de vista da gestão da assistência a estrada a percorrer ainda é longa. E, indo ao cerne da questão nesta vertente, segundo a Consultoria e Gestão Einstein, “um dos atuais desafios das instituições de saúde diz respeito à gestão dos profissionais do corpo clínico. Pelo grande volume de atividades deste público os desafios se multiplicam, pois é necessário engajar os médicos, estreitando o vínculo com a instituição e, ao mesmo tempo, buscar a aderência às práticas da organização.”
Mas esta realidade ainda está extremamente distante na imensa maioria dos hospitais que mantêm corpo clínico aberto e carecem de programas de relacionamento com os mesmos que permitam, entre outras ações, a geração de indicadores de desfecho clínico e, consequentemente, a construção de propostas de valor assistencial para os pacientes e financiadores.
Costumo dizer que temos, como “samba de uma nota só”, o case de cirurgia da coluna do Hospital Israelita Albert Einstein. O programa em questão reavalia indicações de cirurgias de coluna encaminhadas por determinadas operadoras de planos de saúde. Além do diagnóstico, o programa encaminha os pacientes para o tratamento mais recomendado, sendo que em mais de 40% dos casos, não foi necessária a cirurgia inicialmente recomendada.
Louvável esta iniciativa que trouxe resultados expressivos, principalmente para o paciente que passou a ter o tratamento adequado às suas necessidades e não aquele mais conveniente para a indústria de insumos e determinados médicos. Mas a pergunta que faço é: por que falamos apenas deste caso? A triste resposta é que de fato temos poucas iniciativas como esta. Ou se elas existem, não são divulgadas.
Isto mostra o tamanho do desafio de trazer médicos para perto das instituições, medir seus indicadores de desfecho e construir proposta de valor. Por valor entende-se a equação que tem os resultados obtidos (experiência do paciente, indicadores de desfecho clínico) pelo paciente como numerador e custos econômicos como denominador.
A Gerente de Desfecho Clínico e Continuidade do Cuidado do Hospital Sírio Libanês, Carla Ledo, em sua brilhante apresentação durante o Hospital Summit, demonstrou as etapas e desafios do programa de desfecho clínico iniciado há pouco menos de um ano. Destacou como desafio o cuidado na forma de abordar o tema junto aos médicos de maneira que gere o engajamento dos mesmos. E, mais ainda, o aval destes mesmos médicos na abordagem pós- alta aos pacientes.
Como filho e neto de médico e tendo atuado nas áreas comerciais de dois hospitais, concordo que o cuidado na forma de “institucionalizar” o médico é fundamental para vencer a frequente desconfiança dos mesmos. Afinal, médicos não gostam de ser avaliados e muito menos comparados.
Porém, se as instituições de saúde de fato querem se diferenciar de seus concorrentes daqui para frente terão que dedicar todos os esforços para trazê-los para perto e fazer com que enxerguem que são partícipes do processo de construção de valor das instituições onde trabalham.
Por pressão dos financiadores, a diferenciação das instituições de saúde deixará cada vez mais de ser pautada apenas por reputação e passará a ser avaliada também com base em critérios objetivos. Isto necessariamente fará com que os hospitais reflitam, avaliem e redefinam suas estratégias a partir dos diferenciais de valor que de fato têm e não mais aqueles que eles acham que têm. Este é um caminho sem volta para os hospitais que querem se manter vivos.