Tenho abordado frequentemente neste espaço a questão do papel fundamental das empresas na gestão de saúde de seus colaboradores. Acredito que esta frente tem inúmeros desdobramentos, sendo um dos principais o comprometimento dos colaboradores com sua própria saúde.
Conforme dado do Center of Disease Control (CDC) americano, mais da metade dos custos de saúde naquele país têm relação com hábitos de vida. Muito provavelmente, a ordem de grandeza no Brasil não é muito diferente.
Recordo-me de participar há alguns anos do evento de lançamento do site do Dr. Drauzio Varella, quando pude refletir sobre o tema. Na ocasião, um conhecido e renomado médico sanitarista fazia a sua apresentação após a minha. O seu conhecimento sobre temas da saúde era proporcional ao descuido com a sua própria saúde. Fiquei curioso para ver o que ele teria a dizer depois de eu ter citado reflexões provocativas entre as quais uma do próprio Dr. Drauzio Varella em seu livro Borboletas da Alma:
“É inacreditável a resistência do ser humano ao sofrimento físico. Em mais de trinta anos de medicina, vi doentes enfrentar cirurgias mutiladoras… submeter-se a tratamentos agressivos… resistir a dores lancinantes… lutar para preservar a vida até sentir exaurido o último resquício de suas forças.
O heroísmo com o qual defendemos nossa existência quando ameaçada, no entanto, contrasta com a incapacidade de mudarmos estilos de vida que conduzirão a doenças gravíssimas no futuro.”
Genial como é, o médico que me seguiu fez uma reflexão interessante. Reconheceu, apontando para sua cabeça, ser grande conhecedor de temas da saúde. Em seguida, percorreu com o dedo indicador desde a sua cabeça até o coração e concluiu afirmando que aquele caminho entre a mente e o coração era curto do ponto de vista corporal, mas longo do ponto de vista existencial, na medida em que ele mesmo tinha dificuldades em colocar em sua prática o conhecimento acumulado. Algo como dizer que “a teoria, na prática, é diferente.”
Longe de procurar entender o que o imobilizava neste sentido (assim como faz com boa parte das pessoas que cuidam de tudo menos da saúde), peguei-me pensando sobre algo que pode encurtar o caminho entre teoria e prática: incentivos!
Somos movidos a incentivos e os incentivos corretos podem fazer milagres. Vejamos o que ocorreu com fumantes no Brasil. Além da proibição de veiculação de propagandas nos meios de comunicação as imagens nos maços de cigarro de verdades que doem e chocam, a proibição de fumar em lugares públicos também contribuiu para a mudança de comportamento em uma geração, uma única geração. Fumar hoje, diferente de quando eu era jovem, deixou de ser sinal de status para ser algo altamente questionável.
Falando em tabagismo, é totalmente compreensível que seguros de vida cobrem menos daqueles que não fumam do que daqueles que fumam. Afinal, isto representa nada mais do que ajustar o preço ao risco. Mas por que isto, entre outros tantos hábitos nocivos à saúde, parece questionável quando falamos de planos de saúde?
E antes que o time do “isto não pode” se pronuncie, desde 2011 existe uma resolução normativa da ANS (265) que “dispõe sobre a concessão de bonificação aos beneficiários de planos privados de assistência à saúde pela participação em programas para Promoção do Envelhecimento Ativo ao Longo do Curso da Vida e de premiação pela participação em programas para População-Alvo Específica e programas para Gerenciamento de Crônicos.” Porém, jamais vi operadoras colocarem em pratica esta possibilidade. E, menos ainda, empresas demandarem isto das operadoras em linha com este dispositivo legal. Independente desta previsão regulatória de atrelar incentivos à participação em programas de saúde, são raríssimas as empresas que tem em suas políticas incentivos para que colaboradores passem a adotar bons hábitos de vida.
Assim como as empresas, indivíduos devem ser chamados à responsabilidade. Assim como a mudança de postura das empresas já citada neste espaço, o protagonismo de colaboradores em relação à sua saúde pode ser incentivado pelas próprias empresas.
Por fim, uma boa notícia. Soube que o médico acima citado perdeu mais de 60 quilos e goza de uma saúde muito melhor. Desconheço os incentivos que o levaram a despertar mas, de novo, as empresas como contratantes de planos de saúde têm a obrigação de colocar este assunto em suas agendas.