Em junho, quando o STJ (Superior Tribunal de Justiça) decidiu que o rol de procedimentos da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) é taxativo, dissemos aqui no blog que o assunto ainda renderia muito debate.
E está rendendo.
O estabelecimento do rol exemplificativo acabou se tornando objeto de um projeto de lei que foi aprovado pelo Congresso no fim de agosto e que, até a publicação deste texto (setembro de 2022) ainda não havia sido sancionada pela Presidência da República.
Então, mais uma vez nos debruçamos sobre o tema. Quais são as implicações dessa nova mudança? Tudo volta a ser exatamente como era antes? Nos acompanhe na leitura!
Relações desequilibradas
O primeiro tópico para considerar é que a discussão sobre a natureza do rol de procedimentos da ANS tenha talvez chegado em um momento errado. Estamos nos referindo ao período eleitoral.
O tema é sensível e a aprovação em grande velocidade, com votação simbólica (por unanimidade) no Senado mostra que o objetivo da classe política foi uma decisão focada nos interesses do consumidor e nada mais. Não se levou em conta os efeitos de longo prazo para este mesmo consumidor que, a médio prazo, sentirá o custo dessa medida nos próximos reajustes – que para 67% do mercado, dos planos empresariais, é uma decisão de livre negociação.
Foi uma discussão apressada, e que deve sim ser feita, mas de um modo muito mais aprofundado, para contemplar a complexidade do tema. Mais uma mostra de que, assim como na decisão do STJ, a aprovação da lei não coloca um ponto final na questão.
Como fica agora?
O principal argumento a favor do rol exemplificativo é que a lei aprovada não cria nenhum direito novo – apenas retoma o cenário anterior, quando beneficiários conseguiam com mais facilidade, na Justiça, o acesso a procedimentos não cobertos pelo rol.
Não é bem assim. Por que, mesmo após a decisão do STJ, juízes de tribunais inferiores continuaram emitindo decisões favoráveis aos beneficiários e contra as operadoras, mesmo porque a sentença do STJ previa exceções e não foi vinculante – ou seja, segui-la não era mandatório.
Além disso, a decisão de transformar o rol taxativo veio de carona em outra medida anterior, que tornou a revisão do rol mais flexível. Até o início do ano, novos procedimentos só eram incluídos no rol a cada seis meses. Agora, podem entrar a qualquer momento, desde que atendam os trâmites necessários. Também vale ressaltar a recente regulação da ANS eliminando o limite de sessões para terapias.
Quem vai pagar a conta?
Ou seja: o saldo final dessa movimentação toda é, em uma análise superficial, benéfica para os beneficiários e prejudicial às operadoras. E é nessa visão maniqueísta, de “bem contra o mal”, que mora o problema.
Simplesmente porque não significa que as operadoras seguirão a nova lei de modo passivo, assumindo os prejuízos eventuais dela decorrentes. As operadoras são empresas privadas, que visam lucro, e continuarão em busca dele.
O rol exemplificativo, a grosso modo, representa mais custos, e eles serão repassados aos beneficiários – se não agora, em algum momento, e se não para os atuais beneficiários, para os novos. Não existe almoço grátis – o clichê, nesse caso, é bastante verdadeiro.
Vale lembrar ainda que o sistema de saúde suplementar (que, aliás, como o próprio nome diz, deveria ser apenas um suplemento) funciona com base no mutualismo, mesmo princípio dos seguros. O cliente (beneficiário) não financia apenas o próprio plano, mas todo um grupo. Se fica mais caro pra um, fica mais caro para todos.
Conclusão
De forma geral, a definição do rol como exemplificativo ignora todo o processo de incorporação de procedimentos e coloca em xeque a própria existência do rol de coberturas (que se tornaria meramente decorativo) e da saúde suplementar em si. Para que uma legislação se a cobertura é ilimitada?
Não é o caso de defender as operadoras, mas quais empresas estão dispostas a comercializar um serviço cujo preço é impossível de calcular?
Por preservar a segurança jurídica e os critérios técnicos, o rol taxativo garante a viabilidade e sustentabilidade da saúde suplementar, e é o sistema que melhor protege a coletividade dos beneficiários de planos de saúde (mesmo que ainda não seja o ideal).
Como dissemos acima, ainda é um assunto que deve render. Continuaremos acompanhando.
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