Durante a pandemia acompanhamos o impacto do represamento das demandas e dos indicadores econômicos sobre o número de beneficiários. Para falar apenas nas análises mais recentes, escrevi dois artigos em 24/02 e em 12/03 deste ano abordando sobre a incrível recuperação do número de beneficiários. Ao contrário do previsto, além do número não cair, ele cresceu até aquele momento em aproximadamente 900 mil de novos entrantes em 2020 se considerarmos que houve uma queda antes da recuperação e crescimento. Também falei sobre como se desenhava um contexto inédito de VCMH negativa.
Em 11/03/2021 fizemos um webinar com o tema O que aconteceu com o custo saúde no Brasil e nos Estados Unidos durante a pandemia? Nesse evento, que meu sócio Adriano Londres e eu fizemos junto com o ilustre André Medici, mesmo sem ter os dados públicos completos de 2020 (tínhamos disponíveis apenas os dados acumulados até o terceiro trimestre) já estimávamos que seria inevitável uma VCMH negativa em 2020 com a expectativa de desdobramentos que afetariam o reajuste. Naquele momento tínhamos um crescimento efetivo de beneficiários, sinistralidade em queda de 10 pontos percentuais comparada ao mesmo período de 2019, mais de 900 mil beneficiários ingressos no sistema e uma VCMH negativa parcial de -8,34%.
Desde então temos aguardado com expectativa o fechamento dos indicadores públicos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) referentes ao ano de 2020.
Semana passada esses dados foram disponibilizados no Tabnet e na Sala de Situação da ANS, permitindo que finalmente pudéssemos calcular os indicadores per capita e consequentemente a VCMH-Brasil 2020. Aqueles que têm acompanhado nossas publicações sobre o cálculo da VCMH com série histórica desde 2014 sabem que não consideramos apenas os montantes divididos pelos 12 meses de cada ano, mas o tempo médio de exposição, ou seja, as entradas e saídas dos beneficiários que podem impactar de forma sensível o índice. Em tempos de estabilidade isto não é tão importante, mas em tempos de grande mobilidade, temos que levar em consideração que os últimos beneficiários entrantes não contribuíram 12 meses para o sistema. Em 2020 isso é particularmente importante já que agora sabemos que começamos o ano com 47 milhões, tivemos um vale de 46,7 milhões e depois um pico e saldo em dezembro de 48 milhões. Considerando o menor e o maior número, tivemos 1,3 milhões de novos entrantes. Um número muito impressionante e que segundo o comparativo histórico da Sala de Situação da ANS foi impulsionado pela modalidade coletiva empresarial. Aproximadamente um aumento de mais de 830 mil vidas com vínculo CLT ou estatutário. Considerando a diminuição do emprego formal, podemos supor que boa parte desse número seja de um tipo muito peculiar de contrato empresarial, formado por profissionais autônomos com CNPJ ativo já que as operadoras têm inclusive intensificado seus esforços para produtos empresariais com uma ou duas vidas.
Enfim, considerando toda essa mobilidade em 2020, o tempo médio de exposição calculado para 12 meses seria de 11,77 meses e para 2019, ano muito mais estável, seria de 11,93.
Claro que o cálculo do tempo médio de exposição considera um certo nível de ponderação já que não temos nenhum dado preciso de entrada e saída de beneficiários, mas considerando os grandes números e sua divulgação trimestral pela ANS, o cálculo que fazemos traz uma razoável segurança na estimativa.
Isso faz diferença? Sim! Se calculássemos a VCMH per capita dividindo ambos os períodos por 12 teríamos uma VCMH negativa de -5,97%, mas ao considerar o tempo de exposição estimado temos uma VCMH-Brasil 2020 negativa de -4,64%.
Como sempre, assim que for disponibilizado o mapa assistencial de 2020 faremos o cálculo completo do índice distribuindo os pesos por grupos de despesas e a participação da frequência e do custo no índice total. Com certeza a variação da demanda em 2021 será negativa e a do custo provavelmente positiva.
O último trimestre de 2020 foi de alta na sinistralidade com índice de 82,54% (considerando o delta da Sala de Situação de setembro versus dezembro). Definitivamente uma alta considerando que durante a pandemia o índice médio caiu para 75%, mas por outro lado não é possível afirmar que é uma compensação. Por enquanto é muito mais uma volta à normalidade já que o indicador médio histórico da sinistralidade dos últimos anos é entre 82% e 84%.
O próximo movimento está com a ANS ao calcular o teto de reajuste dos planos individuais. E com as operadoras que, por sua vez, divulgarão o reajuste sem o indicador de VCMH que baliza parte do índice total de reajuste dos planos coletivos e de movimentos políticos de olho em talvez intervir mais uma vez na aplicação dos reajustes de plano médico em 2020.