Arquitetos da Saúde

Ampliando a Perspectiva de Valor em Saúde: Uma Proposta para o Contratante

Numa rápida pesquisa no Google sobre “valor em saúde para o paciente” surgem mais de três milhões de resultados.  Esta ordem de grandeza nos dá uma ideia sobre o quanto o tema tem sido debatido pelos atores do sistema de saúde mundo a fora.

No Brasil, o assunto foi abordado com destaque em 2006 à época do lançamento do livro “Repensando a Saúde”, de Michael Porter e Elizabeth Teisberg. Porém, na prática, somente nos últimos poucos anos o mesmo passou a ser incorporado à agenda prática dos gestores de saúde por aqui.

O tema é tão necessário e desafiante que motivou inclusive a recente criação do Instituto Brasileiro de Valor em Saúde (IBRAVS), entidade sem fins lucrativos que tem como objetivo primordial “a transformação do sistema de saúde brasileiro, consolidando, validando e padronizando toda a informação de resultados dos pacientes e impulsionando, por meio desse conhecimento, uma prestação assistencial fundamentada em entrega de valor.”

Como não poderia deixar de ser, o foco prioritário desta discussão dever ser, sem qualquer sombra de dúvida, o paciente. Porém, para que os resultados neste sentido sejam efetivos, precisamos ampliar estas discussões e ações para todos os demais elos da cadeia do sistema de saúde. Não obteremos êxito de forma sustentável sobre esta matéria se não nos debruçarmos para desatar todos os nós e eliminar as caixas pretas que quase sempre se apresentam nas diversas relações que compõem esta cadeia.

Como sabemos, no caso específico da saúde suplementar, o caminho até se chegar ao paciente é longo, envolvendo uma série de atores, entre os quais: o financiador, o corretor, a operadora, os profissionais de saúde, as instituições de saúde, a indústria, os distribuidores e, finalmente, o paciente.

Não bastasse isto, partindo de uma simples equação de valor onde os desfechos compõem o numerador e os custos o denominador, podemos dizer que, com enorme frequência, ambas as variáveis não são efetivamente pactuadas e conhecidas ao longo de todos os elos. Por fim, do ponto de vista do variável custo, o tema se torna ainda mais complexo quando constatamos que, além de muitas vezes desconhecidos, estes são ainda conflitantes.

Feita esta constatação, não podemos subestimar o caminho a ser percorrido no sentido de construirmos propostas de valor ao paciente. Insisto que, para tal, temos que necessariamente percorrer todos os degraus, discutindo o conceito de valor (desfecho/custo) para cada um dos elos. Em outras palavras, como me disse recentemente o presidente do IBRAVS, professor Cesar Abicalaffe, “a discussão de valor tem que abordar todas as perspectivas da cadeia de saúde, pois valor depende da perspectiva.”

Nesta mesma linha, em publicação recente sobre o tema, o físico e mestre em Engenharia Nuclear, Clemente Nóbrega, citou que “o arranjo tem que ser fractal. Um sistema é fractal se cada pedaço reproduz uma miniatura da coisa inteira.” É com este foco que temos que fazer o dever de casa sobre valor em saúde, abordando todos os elos da cadeia.

Sim, mas por onde começar, afinal, se somos inundados e quase asfixiados com notícias e informações sobre o tema, algo que muitas vezes produz mais angústia do que ação?  A meu ver, o caminho passa pela recente reflexão da ex-diretora da ANS, Martha Oliveira, em um comentário no grupo de Whatsapp do IBRAVS. Disse ela com absoluta clareza: “para virar o jogo precisamos começar com o que temos.” Simples assim!

Neste sentido, considerando-se ainda o recente e fundamental despertar do pagador final de dois terços do sistema (leia-se empresas contratantes), gostaria de propor uma agenda preliminar relacionada a valor em saúde na ótica deste ator. Abaixo, um checklist de apenas algumas variáveis que afetam a discussão de valor em saúde, e que, a meu ver, devem começar a ser demandadas por quem contrata um plano de saúde para os colaboradores.

O que cobrar do seu corretor?

 

O que cobrar de sua operadora?

 

O que cobrar da rede de prestadores?

 

Naturalmente que os pontos acima estão muito longe do que efetivamente pode ser feito no sentido de construir uma agenda de valor em saúde nas diversas inter-relações dos contratantes. O objetivo aqui não é esgotar o assunto, mas apenas provocar uma reflexão inicial que aponte um caminho para sairmos da inércia coletiva. E, neste sentido, independentemente dos passos que inúmeros contratantes já vêm adotando intramuros (ex: Fundação Zerrenner / AMBEV) e do simples roteiro preliminar acima proposto, é fundamental ir muito além.

Contratantes precisam ir além de seus encontros temáticos que, independentemente  de sua absoluta importância, têm sido mais terapêuticos do que práticos do ponto de vista coletivo. E, neste sentido, assim como já fizeram TODOS os demais elos da cadeia de saúde, chegou a hora de se colocar de pé uma entidade específica de grandes contratantes de planos de saúde para que, de forma organizada, representem seus interesses legítimos, sempre com um olhar voltado para a sustentabilidade do sistema.

A meu ver, a organização setorial do contratante de plano de saúde será um marco para elevar a régua da assistência prestada e da sustentabilidade do sistema como um todo.

Com a palavra e, espero, as ações práticas, os contratantes!